Pelo Desarmamento do Trânsito

Essa semana os maiores jornais do Rio Grande do Sul descobriram o que nós já sabíamos: que os automóveis são armas e são responsáveis por grande parte da violência de nossa cidade. Segundo um estudo do DETRAN (Departamento Estadual de Trânsito), nos primeiros seis meses de 2010 o número de mortes no trânsito (846 fatalidades) foi equivalente ao número de vítimas de crimes (848 homicídios). Isso sem contar o enorme número de feridos – mais de 23 mil! – e as mortes indiretas, como as causadas pela poluição do ar. Segundo Estevão Segalla, químico do laboratório de ar da Fepam, os veículos automotivos são os principais causadores da poluição atmosférica do município: “Porto Alegre não tem mais indústria nenhuma praticamente, então se sabe que o grande impactador da qualidade do ar são os carros,utilizando gasolina ou etanol,  e o diesel dos ônibus e caminhões.” (fonte)

Mas a imprensa tradicional ainda não consegue pensar fora da caixinha à que está acostumada, as soluções apontadas incluem fiscalização eletrônica, lei seca e melhoria da sinalização e condição da via. Só que o  problema é bem mais embaixo.

O que torna tudo tão perigoso não é o fato de o/a motorista estar embriagado, distraído, apressado – pessoas estão sujeitas a isso (e é impossível evitar que todos os motoristas se distraiam por um segundo sequer) – o problema é o fato milhares de máquinas metal de uma tonelada estarem se deslocando pela cidade densamente povoada a 30, 50, 80 km/h. Em algum momento um dos milhares de motoristas irá se distrair, um freio irá falhar, uma criança se atravessará no caminho e isso basta para alguém morrer. O carro é um acidente procurando um lugar para acontecer.

Se alguém estiver bêbado, mas estiver a pé ou de bicicleta, dificilmente causará um acidente de trânsito muito grave, se não encontrar um carro (leia-se, pelo menos 800kg de metal em alta velocidade) em seu caminho.

É incrível que em todas matérias que li a respeito do horrendo número de mortes no trânsito, nem uma única sequer dava a entender que a solução era diminuir o número de veículos em circulação, restringir a circulação de automóveis particulares, desarmar o trânsito. O carro é de fato uma arma, apontada para qualquer um que aparecer em seu caminho. E não adianta, a partir do momento em que temos milhares de armas em circulação, por mais que seus proprietários sejam cuidadosos, alguma hora um acidente vai acontecer e alguém vai se ferir.

Precisamos de um trânsito mais inofensivo, menos violento, com menos veículos automotores nas ruas – idealmente apenas coletivos e carros de emergência – um trânsito mais humano. Precisamos de mais bicicletas e menos carros, principalmente menos carros.

Desarme-se, vá de bici.

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7 respostas para Pelo Desarmamento do Trânsito

  1. Olavo Ludwig disse:

    É…eu sempre digo, um motorista é um indivíduo brincando de roleta russa, e principalmente, com cabeça dos outros. Muitas vezes sou obrigado a ser motorista, não gosto disso, mas acaba sendo inevitável, mesmo pra mim, um cicloativista, tendo um filho pequeno fica impossível fazer deslocamentos apenas de bicicleta em Porto Alegre, devido a falta total de estrutura somada a enorme quantidade de carros nas ruas, minha vida eu arrisco diariamente e por incrível que possa parecer aos motoristas, andar de bicicleta, mesmo com os riscos, nos faz muito mais felizes, já a vida do meu filho eu não consigo arriscar. Dá vontade de chorar quando penso que se a cidade fosse cheia de ciclovias ou com uma frota de carros de 10% do tamanho atual, poderia andar diariamente com ele, sem medo. E de quebra todos teriam uma vida mais saudável!!!

    • Marcelo disse:

      Olavo,
      Será que não é mesmo possível ter um filho em Porto Alegre sem ter carro?

      Eu, sinceramente, acredito que é possível. Quanta gente o faz? Quantas famílias não têm carro, por não ter condições de bancá-lo, mas possuem filhos? Acho que é possível e não é complicado, principalmente se a criança estiver matriculada em uma escola perto de onde você mora. Eventualmente, você pode levar ela a algum lugar de ônibus ou de táxi, não me parece complicado.

      • Olavo Ludwig disse:

        Marcelo,
        É possível sim, mas para crianças muito pequenas o ônibus não é seguro nem prático, pois criança sempre exige carregar várias coisas, e mais a criança, e nossos motoristas de ônibus dirigem agressivamente, como se os passageiros fossem carga a ser acomodada, pra gente grande e não idoso, isso não chega a ser um grande problema, já o táxi é melhor que o carro particular na questão de praticidade e também custo, o custo talvez seja maior quando a criança ainda é muito pequena e a escolinha é um pouco longe, mas a medida que ela fica maior o transporte por lotação e ônibus se torna mas prático, já seguro, ele não é para ninguém. No dia que o Bernardo nasceu roubaram nosso carro, ficamos uns 5 meses sem carro, mas quando minha esposa teve que voltar ao trabalho ela quis outro carro, pois ela trabalha em Novo Hamburgo, e não consegui convencê-la de não comprarmos. Hoje como temos um carro na garagem, acabamos utilizando-o sempre para levar e buscar o filho na escolinha e médicos, que fica a mais ou menos 2,5km de casa, já levei ele algumas vezes de bicicleta com o reboque, mas tenho que ir pelas calçadas o que fica muito ruim, pois as calçadas também são horríveis, os dias que a Liza está em NH com o carro eu uso o táxi, acho muito melhor que o carro, pois não preciso me preocupar com mais nada além do filho e as coisas a carregar. O carro ainda acaba sendo muito útil também para os passeios com o Bernardo junto, principalmente para ir na minha sogra que mora na Restinga e eu na zona norte, táxi para lá sai muito caro e ônibus é mais horrível que os ônibus mais centrais. E com todos os custos que já temos com o carro às vezes mesmo sendo mais prático o táxi acabamos usando o carro, devido ao custo extra que seria o táxi. Antes de comprar o carro, eu fiz todos os cálculos para minha esposa, mostrando que seria melhor usar táxi e alugar carros de vez em quando, com esta história de alugar nos finais de semana, gastaríamos o equivalente a comprar um carro com todos os seus custos, ai não consegui convencê-la. Não nego que o carro tem sua utilidade e é um conforto para algumas situações, mas não gosto nem um pouco de depender dele, queria poder usar minha bicicleta com o reboque muito mais do que uso, e só usar táxi quando realmente fosse impossível pedalar com o guri (o que para mim seria quase nunca). Penso que com todo esse relato dá para sentir um pouco o meu drama!

      • Olavo Ludwig disse:

        Desculpem, o texto do comentário acima ficou ruim, pois acabei postando sem revisar e editar, qualquer dúvida perguntem.

  2. Excelente matéria!!! Assino embaixo de tudo!!!
    De fato, eles topam qualquer coisa pra resolver que não seja largar o carro… Uma cultura de carro que fosse por sua funcionalidade, até justificaria a demora em não inibir sua utilização, mas prejudicar tudo mais pra não deixar de ser “chique” (que é o que está por trás de muito dessa resistência em deixar o carro na garagem) é muita trouxisse!
    Abraços!

  3. Sergio Surdo disse:

    É isso aí, Olavo. Há uns cinco anos atrás, quando afirmeu para muitos que o transito nas grandes metrópoles seria a praga do futuro, me chamaram de louco. Agora me dão razão. Não tem mais saída, já estou pensando seriamente em voltar para o interior da pacata e tranquila Sentinela do Sul, de tanto odiar este maluco transito.

  4. Sergio Surdo disse:

    quando afirmei, corrigindo a mensagem anterior

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